ELABORAR PROJETOS SOCIAIS: Tortura, Missão, ou as duas coisas?

Quando você recebe a incumbência de elaborar um projeto social como se sente? Numa sala de tortura, numa missão, ou as duas coisas? Ouso dizer que sua resposta é tortura ou as duas coisas. Acertei, não é mesmo?

Mas esse texto pode ser o fim desse sentimento e o início de uma nova postura diante da maravilhosa missão de elaborar projetos sociais! Leia até o final, siga os passos e experimente essa nova fase.

Antes de tudo, uma perguntinha pra você refletir e se colocar no lugar de quem está avaliando seu projeto: Quando seu filho te pede dinheiro, você simplesmente dá, ou você questiona as intenções e motivos dele? Estou certa que, assim como eu que também sou mãe, quanto melhor os objetivos dele, sua justificativa, a gravidade do problema que ele pretende resolver com o dinheiro, maior será a quantia e a rapidez com que você irá entregar não é? E se ele te der bons feedbacks do que fez com o dinheiro, maiores a chances de você investir novamente não é? Pois bem! Bem vinda ao mundo dos financiadores!

Agora que você já sentiu como é estar do outro lado, você precisa saber que elaborar é uma ação coletiva, mas escrever é um ato individual. Não elabore um projeto sozinho, você tem grandes chances de cometer graves erros (e não estou falando de erros de redação, de uso da linguagem, de gramática ou ortografia), estou falando de erros estruturais que podem comprometer todo o projeto. E aqui chegamos ao final da primeira dica: faça um cronograma com, no mínimo, 3 reuniões com as pessoas (membros da equipe, voluntários, beneficiários) que irão participar da fase de elaboração e planejamento.

As reuniões irão auxiliar nas principais definições do projeto, quais sejam: 1. Identificação do problema; 2. Identificação das causas e efeitos do problema; 3. Identificação dos objetivos, atividades e metodologias. Ao final das reuniões você terá todo o esboço do projeto concluído, e restará, tão somente, fazer as “amarrações” entre os itens e escrever o projeto, que é um exercício individual, podendo, até mesmo, ser terceirizado. Para que todas essa definições fiquem bem claras, vamos falar sobre cada uma delas e também sobre os demais itens de um bom projeto social, que incluem: contextualização, justificativa, indicadores, fontes de verificação, cronograma e orçamento.

1. Identificando o Problema

Você já deve ter ouvido a expressão “não se deve abraçar o mundo com as pernas”. Isso significa que precisamos estabelecer um foco de atenção, devemos direcionar nossos esforços para que possamos alcançar os objetivos. Se saímos atirando para todo lado, temos menos chances de acertar o alvo. Por isso, você deve identificar um problema para enfrentar.

Para definir que problema é esse, diante de tantos problemas que enfrentamos, em tantas áreas, faça uma autoanálise: I. Avalie os principais problemas da comunidade local e liste-os. O que a comunidade afirma precisar? II. Dentre os vários problemas listados, avalie qual deles é a expertise da atuação de sua instituição e, assim, você terá escolhido uma área de atuação* do seu projeto de acordo com sua identidade institucional; III. Após reconhecer a área de atuação do seu projeto, defina o público a quem ele se destina, seja específico, por exemplo, crianças na faixa etária entre 3 e 7 anos. Quando você faz essa autoanálise das condições da comunidade, da sua instituição e demandas do público, você finaliza a identificação do problema.

Existem algumas dinâmicas que te ajudam a conduzir esse processo em equipe, de forma leve e eficiente, e nossa equipe pode te orientar nisso também.

* áreas de atuação: educação, saúde, meio ambiente, enfrentamento da pobreza, desigualdades, violências, etc.

dicactus: o problema será expresso em uma frase, clara, objetiva e bem direcionada. Alguns materiais e documentos podem te auxiliar no reconhecimento dos problemas que já foram diagnosticados: ex. metas dos ODS’s da Agenda 2030 da ONU; Tipificação Nacional da Assistência Social – Resolução 109/2009.

2. Identificando as Causas e os Efeitos do Problema

Os psicólogos tem ótimas estratégias para nos ajudar a enxergar o que está por trás daquele problema que estamos enfrentando. A verdade é que eles nos ajudam a identificar as raízes dos nossos problemas, para que assim possamos construir estratégias de enfrentamento ao que realmente está causando dor, e não passemos o resto a vida dependente de paliativos que vão apenas remediar os efeitos desse problema. Parece bem filosófico não é?! Mas, acredite! É imperativo definir as raízes e os frutos de um problema, não apenas para a vida pessoal, mas para os projetos sociais**! E eis aqui a nossa metodologia: a árvore de problemas.

Uma excelente dinâmica que pode te ajudar nessa fase da elaboração do projeto é o desenho da árvore de problemas e de objetivos. Faça duas grandes árvores, uma ao lado da outra. Desenhe todos os elementos: o caule, as raízes, a copa, e os frutos. Na primeira árvore, escreva no caule o problema que você definiu no passo anterior, e agora discutam fazendo os seguintes questionamentos: quais as causas deste problema? quais as suas raízes? E escreva cada uma delas nas raízes da árvores; em seguida questione novamente a equipe: quais os efeitos desse problema? quais os frutos dessa árvore ruim? Sua árvore de problemas estará concluída.

** regra geral projetos que atuam nas raízes são mais longos, demandam mais tempo de execução, são mais caros, mas, mais eficientes; projetos que atuam nos efeitos, ao contrário são mais curtos, devem demandar menos tempo de execução, são menos onerosos e menos eficientes para acabar com o problema.

dicactus: é desejável que o objetivo comece com um verbo, para exprimir uma ação necessária; não use verbos “exagerados” como: acabar, garantir, transformar, pois lembre-se que você precisará comprovar o antes e o depois, e isto pode se tornar muito penoso na fase de prestação de contas.

3. Identificação dos Objetivos, Atividades e Metodologias

Agora, na árvore que você desenhou ao lado, escreva os objetivos. Os objetivos nada mais são que os problemas solucionados. Por exemplo, se definimos como problema “adolescentes expostos às ruas, à criminalidade, às violências e abusos”, nosso objetivo geral é “adolescentes em espaços seguros, não expostos às ruas, à criminalidade, à violências e abusos”. Se um das raízes é a falta de espaços de lazer e esporte, na árvore de objetivos a solução será oferta de espaços de lazer e esporte. Ao final teremos a árvore de problemas e a árvore de objetivos, nela estarão descritos o objetivo geral, os objetivos específicos (raízes) e os resultados esperados (efeitos). Simples assim!

Selecione até três raízes ou três efeitos que seu projeto atuará para ajudar na solução do problema central. Regra geral, os projetos financiados com recursos de lei de incentivo possuem curta duração, portanto, mantenha os pés no chão. Você não resolverá problemas sociais crônicos em 2 (dois) anos. Seja realista, por isso, para projetos de até 2 (dois) anos, recomendo, no máximo, 5 (cinco) objetivos específicos!

Vamos às atividades?! As atividades não são definidas de forma aleatória, mas devem responder à pergunta: para alcançar esse objetivo específico, que atividade irei realizar? Isso significa que para cada objetivo específico devemos corresponder ao menos 1 (uma) atividade que será realizada. Então, se tivermos 3 objetivos específicos, teremos que realizar, no mínimo, 3 atividades.

E metodologia? Bom, essa explicação mereceria um post inteiro, pois causa muita confusão. Posso resumir dizendo que a metodologia é a chave para o sucesso do seu projeto! Ela é o diferencial, é o que chama atenção num bom projeto. Raciocine comigo: o que torna uma escola melhor do que a outra se as duas oferecem as mesmas disciplinas? Isso mesmo! É o método! É a prática de um grupo de procedimentos que cria um jeito especial de repassar aquele conteúdo.

A boa notícia é que você não precisa “inventar a roda”, já existem excelentes metodologias no mercado que estão à sua disposição.

dicactus: faremos um post exclusivo só pra te apresentar algumas das várias metodologias para projetos sociais que já existem!

Estamos quase finalizando! Como você se sente até aqui? Espero estar ampliando seu universo informacional a respeito dos projetos sociais. Me conta nos comentários 😉

Após a conclusão das 3 (três) etapas acima você terá concluído todo o seu projeto. Acredite, o que resta é apenas conectar uma coisa à outra. Fazemos isso com o que chamo de “amarrações”.

O item 1 – Identificando o Problema te ajudará a definir o problema e a construir um diagnóstico ou contextualização. O diagnóstico deve conter dados mensuráveis. É um relatório frio daquele problema, portanto deve indicar os números sobre esse problema. Comece falando desse problema no mundo, em seguida fale do contexto brasileiro, depois do contexto regional e finalmente do contexto local. Inclua dados de órgãos responsáveis como: IPEA, IBGE, Governos, Órgãos do judiciário, Conselhos, etc. Tem muito site de qualidade!

O item 2 – Identificando as Causas e os Efeitos te ajudará a descrever a justificativa do seu projeto. A justificativa difere do diagnóstico porque ela tem um caráter emocional, não tão fria quanto os números, mas cita casos específicos e reais. Nesse momento você pode descrever a realidade de uma família local, de uma criança, seus depoimentos, notícias de jornais, etc.

O item 3 – Identificando os Objetivos, Atividades e Metodologias será seu relógio e te ajudará a monitorar se aquilo que você está fazendo, se as atividades que está executando, se as metodologias que está utilizando, estão, de fato, contribuindo para alcançar os objetivos que você definiu lá no começo do projeto. Daí a importância de definir indicadores, fontes de verificação e orçamento para cada atividade. Não se preocupe, vou exemplificar: Se meu objetivo geral é “reduzir a exposição de crianças às ruas e à criminalidade” e um dos meus objetivos específicos é “oferecer espaços seguros de lazer e esporte”, logo uma das minhas atividades poderá ser a oficina de futsal. Se a oficina de futsal é a minha atividade, o meu indicador será aumento do número de crianças participando da oficina de futsal, minha fonte de verificação será a lista de presença (por exemplo) e meu orçamento compreenderá gastos com instrutor, com lanche, com material esportivo e transporte para campeonatos (por exemplo). Veja que se você fizer esse exercício para cada atividade descrita no seu projeto, fica muito fácil saber se você está ou não alcançando seu objetivo geral “reduzir a exposição de crianças às ruas e à criminalidade”.

Finalmente, fale da sustentabilidade do seu projeto, afinal, nenhum financiador quer deixar a instituição de volta ao estado anterior quando ele for embora. Sustentabilidade não se trata apenas da sua capacidade financeira de dar continuidade ao projeto, mas da sua capacidade de articulação com outros atores da comunidade local: governo e sociedade civil. Fale sobre sua capacidade de captar voluntários, de firmar parcerias, de seu engajamento em fóruns e conselhos, mostre que sua instituição sabe se reinventar, no popular, sabe “dar seus pulos”.

Faça tudo isso numa grande folha kraft, ou num quadro branco, registre com foto e só então comece a escrever. A escrita deve ser resultado de uma compreensão geral do assunto. Se você escreve um projeto pelas perguntas do formulário, sem ter uma compreensão geral, acredite: não vai ficar bom, e seu financiador vai perceber que tudo aquilo não passam de promessas aleatórias, mal definidas, desorganizadas e não mensuráveis.

Antes de encerrar só mais uma dica: quando for escrever o projeto vá para um lugar silencioso, coloque uma boa música (de preferência essas que acalmam a nossa alma e nos levam a uma quietude mental) e sente-se confortavelmente. Ah, claro! Desligue o celular, use apenas para pesquisas. Tá ok?

É isso! Até nosso próximo post!

Quer ajuda personalizada? Contrate a Cactus, a gente vai até você, te oferece uma maravilhosa capacitação para toda sua equipe e elabora um novo projeto junto com você. Contate-nos.

Tatyana Gurgel

Em: 24/04/2022

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